6.3.2 A Percepção dos Gestores sobre as Práticas Escolares com Tecnologias Digitais durante a pandemia

6.3.2 A Percepção dos Gestores sobre as Práticas Escolares com Tecnologias Digitais durante a pandemia

 

Para averiguar a percepção dos gestores quanto ao grau de utilização das tecnologias digitais (computadores de mesa ou portáteis, tablets, smartphones, sistemas de videochamadas, softwares, recursos pedagógicos online etc.) nas atividades educacionais das escolas onde eles atuavam antes, durante e após a pandemia da Covid-19, utilizou-se uma escala de frequência de 4 pontos (0 = Nenhum; 1 = Muito pouco; 2 = Algum; 3 = Muito), por meio da qual se obteve dados interessantes relativos ao grau de uso em cada recorte temporal, seguidamente apresentados (Tabela 69).

Tabela 69

Grau de Utilização de TD pelos Gestores Escolares

Grau de utilização de TD

Média

DP

Nenhum (0)

Muito pouco (1)

Algum (2)

Muito (3)

 

 

 

N

%

N

%

N

%

N

%

Antes da Pandemia

0,85

0,692

24

32%

38

50,7%

13

17,3%

0

0%

Durante a Pandemia

2,40

0,735

0

0%

11

14,7%

23

30,6%

41

54,7%

Após a Pandemia

2,31

0,615

0

0%

6

8%

40

53,3%

29

38,7%

 

Quando se analisa os valores médios de utilização de TD nas atividades escolares antes, durante e após a pandemia, na Tabela 69, constata-se que o período antes da pandemia (M=0,85, DP=0,692) apresentou o score mais reduzido, evidenciando um nível de utilização de TD considerado bastante baixo, na visão dos gestores.

Em compensação, os índices mais elevados de utilização de TD foram constatados, respetivamente, nos períodos durante (M=2,40, DP=0,735) e após a pandemia (M=2,31, DP=0,615), indicando um considerável avanço na utilização destes recursos.

Contudo, apesar deste avanço, verifica-se nos percentuais apresentados na Tabela 69 que houve uma redução na frequência de uso de TD de durante a pandemia (54,7%) para após a pandemia (38,7%). A intensificação de uso durante a pandemia pode estar vinculada ao isolamento social e confinamento doméstico vivido pelos gestores e à consequente necessidade de uso das TD para exercerem suas atividades profissionais e sociais.

Na narrativa de GEA (Comunicação pessoal, 5 de novembro de 2022), percebe-se quão intenso foi o uso das TD durante o ERE:

 

Bom, de imediato, eu acredito que nos primeiros meses, os professores ainda não tinham a prática de receber atividades. Porque, assim, alguns não queriam receber por e-mail. Era muita coisa para o e-mail. Havia o acúmulo de atividades que eram mandadas para o e-mail. Aí, eles recebiam algumas por WhatsApp e outros professores, quando começaram a estudar, a buscar as ferramentas, começaram a ver a questão das salas virtuais, do Classroom. Nesse período, eu lembro bem que a gente usou o SigEduc, porque, como eram muitos aplicativos, atividades, os alunos não aguentavam, os celulares não suportavam a quantidade de atividades.

 

Esta redução na utilização das TD após a volta ao ensino presencial também é corroborada pelos dados analisados anteriormente, referentes à continuidade do uso desses recursos pelos gestores e suas escolas. No entanto, os resultados voltam a reiterar a inovação relativamente à inserção das TD ocorrida nas práticas educacionais das escolas públicas de ensino médio do RN.

Após a pandemia, não é mais possível negar a importância de inserir as tecnologias digitais nos vários processos que se desenvolvem no ambiente escolar (gestão financeira, administrativa e pedagógica). Para além do professor e do estudante, o gestor escolar – diretor, supervisor, coordenador - encontra nas tecnologias digitais ferramentas valorosas de apoio para inovar e acompanhar as práticas escolares, tanto administrativa como pedagogicamente.

GEAP (Comunicação pessoal, 20 de outubro de 2022), em conversa, exemplifica como se dá essa inserção da escola na cultura digital: “Hoje, o nosso aluno utiliza o Escola Digital do SigEduc. Por exemplo, o último questionário socioeconômico que tinha sido aplicado na escola, em 2018, foi no papel. Agora, a gente conseguiu aplicar usando o Google Forms”.

Dessa forma, o papel do gestor escolar como utilizador de recursos digitais e incentivador de práticas inovadoras de ensino e aprendizagem com o uso desses recursos na escola assume fundamental relevância, sobretudo para adequar a unidade escolar às demandas da cultura digital contemporânea. A inserção da escola na cibercultura também é depreendida do depoimento de um dos gestores entrevistados:

 

Eu acho que, diante de toda a desgraça, de todas as dificuldades, que foi essa pandemia avassaladora, mesmo assim, aconteceu algo novo, positivo: a incorporação dessas novas tecnologias no ensino e na aprendizagem, já que os professores não eram acostumados e a maioria dos alunos não conhecia. Os alunos só conheciam para redes sociais, só conheciam Instagram, Facebook, WhatsApp. Aí, foi incorporado o Meet, o Classroom e outros recursos usados pelos professores. (GEM, comunicação pessoal, 13 de outubro de 2022)

 

Mediante o aumento no uso de recursos digitais durante e após a pandemia por parte dos gestores e suas escolas, conforme demonstraram os dados analisados, questionados se acreditam que as tecnologias digitais contribuem para as atividades pedagógicas e administrativas da gestão escolar, em uma escala de resposta de 4 pontos (0 = Não, pelo contrário, acredito que atrapalham e burocratizam as atividades de gestão escolar; 1 = Não contribuem, mas também não atrapalham, apenas é uma forma diferente de trabalhar; 2 = Alguns recursos facilitam as atividades de gestão; outros, porém, trazem burocracia e mais trabalho; 3 = Contribuem, sim, deixam a informação mais acessível e mantêm registro de conversas e atividades), verifica-se na Tabela 70 a média de 2,89 e desvio padrão de 0,311, indicativos de um nível considerado bastante elevado quanto à contribuição das TD para as atividades dos gestores.

Reforça-se que, em razão de os valores da escala poderem se situar entre 0 e 3, estabeleceu-se a seguinte correspondência entre valores médios e níveis de contribuição: valores entre 0 e 1,50 ponto representam um nível baixo; entre 1,51 e 2,25 pontos representam um nível moderado, e entre 2,26 e 3 pontos representam um nível elevado.

O baixo DP (0,311) denota uniformidade nas opiniões dos respondentes, evidenciada na concentração no ponto 3 da escala de respostas.

Tabela 70

Percepção dos Gestores sobre a Contribuição das TD para a Gestão Escolar

Contribuição das TD para as atividades de gestão escolar

N

%

Não, pelo contrário, acredito que atrapalham e burocratizam as atividades de gestão escolar (0)

0

0,0%

Não contribuem, mas também não atrapalham, apenas é uma forma diferente de trabalhar (1)

0

0,0%

Alguns recursos facilitam as atividades de gestão; outros, porém, trazem burocracia e mais trabalho (2)

8

10,7%

Contribuem sim, deixam a informação mais acessível e mantêm registro de conversas e atividades (3)

67

89,3%

Média

2.89

Desvio Padrão

0,311

 

Percebe-se, da leitura da Tabela 70, que a percepção dos gestores sobre a contribuição das TD nas atividades de gestão escolar é bastante positiva e confirmada por todos os respondentes. Alguns gestores (10,7%) acreditam nisso com algumas ressalvas, mas a maioria (89,3%) acredita que elas, definitivamente, contribuem.

Em entrevista, GEA (Comunicação pessoal, 5 de novembro de 2022) confirma essa crença na contribuição dos recursos digitais para a gestão escolar:

 

Eu lembro que, quando eu comecei na educação, escutava muito o pessoal dizer: nós recebemos uma televisão, um receptor e uma parabólica. E outros diziam: Olhe, a tecnologia vai tirar o professor da sala de aula. E, ao contrário, a gente percebe que a tecnologia veio para ajudar, melhorar.

GEM (Comunicação pessoal, 13 de outubro de 2022), em conversa, foi taxativa ao afirmar que “o uso de recursos digitais contribui muito”. Outros gestores, em resposta à questão descritiva “Que pontos positivos você identifica na utilização das tecnologias digitais para o desenvolvimento das atividades escolares?”, detalharam algumas das inúmeras formas por meio das quais as TD contribuem para a gestão escolar: “agilidade na comunicação” (G4, comunicação pessoal, 28 de julho de 2022); “possibilita um acesso rápido às informações; otimiza o acesso a um maior número de alunos simultaneamente; facilita o ensino e a aprendizagem” (G47, comunicação pessoal, 22 de outubro de 2022); “capacidade de interação, mesmo estando em lugares diferentes” (G22, comunicação pessoal, 9 de setembro de 2022); “melhor comunicação entre alunos e escola” (G10, comunicação pessoal, 30 de julho de 2022); e, por fim, “o acesso a pesquisas, aulas mais interessantes e alinhadas à realidade atual” (G57, comunicação pessoal, 24 de outubro de 2022).

Apesar dos entraves enfrentados pelas escolas durante o ERE, na percepção dos gestores escolares, alguns aspectos relativos às atividades de ensino remotas não funcionaram, funcionaram razoavelmente ou, ainda, funcionaram bem. Em escala de 3 pontos (0 = Não funcionou; 1 = Funcionou de forma razoável; 2 = Funcionou bem), composta por 21 itens, a Tabela 71 descreve os resultados obtidos em cada item.

Tabela 71

Percepção dos Gestores quanto ao Funcionamento das Práticas no ERE

Funcionamento das Práticas no ERE na Percepção do Gestor

Média

DP

Não funcionou (0)

Funcionou de forma razoável (1)

Funcionou bem (2)

N

%

N

%

N

%

Adaptação e organização das aulas no ERE

1,12

0,366

1

1,3%

64

85,4%

10

13,3%

Adequação da carga horária de trabalho às atividades demandadas

1,17

0,554

6

8%

50

66,7%

19

25,3%

Flexibilidade para organizar as aulas

1,35

0,507

1

1,3%

47

62,7%

27

36%

Administração do tempo da aula e das atividades extraclasse.

1,16

0,494

4

5,3%

55

73,4%

16

21,3%

Participação dos alunos em atividades síncronas.

0,96

0,478

10

13,3%

58

77,4%

7

9,3%

Realização das atividades propostas por parte dos alunos.

0,92

0,458

11

14,7%

59

78,6%

5

6,7%

Autonomia, motivação, determinação e organização dos alunos

0,88

0,519

15

20%

54

72%

6

8%

Conhecimento dos professores para uso de ferramentas e recursos digitais

1,24

0,43

0

0%

57

76%

18

24%

Conhecimento dos alunos para uso de ferramentas e recursos digitais

1,07

0,445

5

6,7%

60

80%

10

13,3%

Acesso dos professores a recursos tecnológicos (computador, internet etc.)

1,36

0,483

0

0%

48

64%

27

36%

Acesso dos alunos aos recursos tecnológicos (computador, internet etc.)

0,99

0,419

7

9,3%

62

82,7%

6

8%

Facilidade de acesso e partilha de informação

1,12

0,401

2

2,7%

62

82,6%

11

14,7%

Aplicação de abordagens pedagógicas diferentes

1,16

0,436

2

2,7%

59

78,6%

14

18,7%

Autonomia para descobrir e experimentar ferramentas e recursos pedagógicos online novos

1,25

0,468

1

1,3%

54

72%

20

26,7%

Informações e orientações às escolas e professores

1,07

0,622

12

16%

46

61,3%

17

22,7%

Formação para atualizar as competências digitais

0,92

0,587

16

21,3%

49

65,4%

10

13,3%

Interação com os alunos

1,04

0,257

1

1,3%

70

93,4%

4

5,3%

Comunicação com os pais dos alunos

0,99

0,419

7

9,3%

62

82,7%

6

8%

Comunicação com os alunos

1,16

0,369

0

0%

63

84%

12

16%

Comunicação com os professores

1,59

0,496

0

0%

31

41,3%

44

58,7%

Interação entre os professores e gestão da escola

1,65

0,479

0

0%

26

34,7%

49

65,3%

 

Aqui também vale ressaltar que, considerando-se que o valor em causa poderia se situar entre o mínimo de 0 e o máximo de 2, determinou-se que valores entre 0 e 1 ponto representam um nível baixo; entre 1,01 e 1,50 ponto representam um nível moderado, e entre 1,51 e 2 pontos representam um nível elevado quanto ao de funcionamento das práticas durante o ERE. Nesse sentido, constata-se que 13 dos 21 scores apresentados nas práticas nominadas na Tabela 71 evidenciaram valores entre 1,01 e 1,50, indicativos de um nível moderado de funcionamento.

Se observados os percentuais apresentados, verifica-se que, no ponto 0 da escala (Não funcionou), algumas das práticas não foram assinaladas pelos gestores, o que leva a inferir que, para esses sujeitos, a maioria das práticas remotas funcionaram de forma razoável ou funcionaram bem. 

Relativamente às práticas que apresentaram os scores mais reduzidos, indicando um nível baixo de funcionamento na visão dos gestores, destacam-se: “Autonomia, motivação, determinação e organização dos alunos” (M=0,88, DP=0,519), “Formação para atualizar as competências digitais” (M=0,92, DP=0,587) e “Realização das atividades propostas por parte dos alunos” (M=0,92, DP=0,458). Observa-se que dois destes aspectos referem-se aos estudantes.

Nas respostas à questão descritiva e nas entrevistas, os gestores também abordam esses aspectos. Com relação à motivação, GEA (Comunicação pessoal, 5 de novembro de 2022) falou sobre a preocupação da escola em motivar os alunos: “Foi uma dinâmica muito complicada no ensino remoto. A gente estava procurando uma música, uma mensagem de autoajuda, para motivar a turma e tinha que ser um vídeo curto e muito atrativo para prender a atenção deles”.

Outro gestor mencionou a “baixa autonomia dos alunos para acompanhar as aulas remotas e a perda da capacidade de organização do tempo no meio virtual” (G65, comunicação pessoal, 27 de outubro de 2022) como desafios enfrentados no ERE.

Nas entrevistas, os gestores mencionaram, ainda, a evasão e falta de participação dos estudantes durante a pandemia, talvez advinda da desmotivação desses sujeitos, relatando o que fizeram para motivar os estudantes:

 

Nós tínhamos 789 alunos em 2020. Foi o total de alunos que concluíram o ano vinculados à escola. Desses 789 alunos, 516 conseguiram participar em algum momento das atividades remotas. Mas, apenas 265 alunos foram aprovados, ou seja, avançaram sem pendências. Os outros tinham pendências. Mais de 500 alunos não conseguiram acompanhar. A gente teve caso de aluno que não participava, mas vinha pegar a merenda. A gente fazia uns kits de merenda para os pais em vulnerabilidade social. Então, às vezes, o aluno não participava das aulas, mas o pai vinha pegar. (GEAP, comunicação pessoal, 20 de outubro de 2022)

 

Houve uma evasão já no final do ano de 2020 e passamos a trabalhar com busca ativa, ligando para os pais, tentando trazer esse aluno de volta. Lembro até que eu inventei uma gincana virtual para tentar motivar esses alunos. Foi bem legal. As tarefas foram bem interessantes, todas virtuais. Eram 20 turmas, 20 equipes. Por exemplo, cada equipe tinha que produzir um vídeo curto usando o celular e postar no TikTok sobre a escola. Aí, o melhor TikTok seria escolhido. Outra tarefa foi produzir uma live com uma temática, por exemplo, violência doméstica, trânsito. Então, ganhava a live que tivesse o maior número de acesso, porque a turma ia ser julgada pelo número de acesso. Os alunos tinham que convidar os colegas para participarem e assistirem às lives. Outra tarefa da equipe era conseguir o maior número de alunos para voltar para a escola, que era uma busca ativa, então os colegas chamavam os colegas, através do WhatsApp. (GEA, comunicação pessoal, 5 de novembro de 2022)

 

Os scores mais elevados da Tabela 71, indicativos de um funcionamento considerado bom, foram apresentados pelas práticas “interação entre os professores e gestão da escola” (M=1,65, DP=0,479) e “comunicação com os professores” (M=1,59, DP=0,496).

A esse respeito, G43 (Comunicação pessoal, 9 de outubro de 2022) relatou que a utilização de tecnologias digitais durante o ERE “facilitou a troca de informações entre os membros da escola”. Essa interação entre escola e docentes manifestou-se também em ações colaborativas com a finalidade de facilitar a troca de informações entre os diversos segmentos da escola:

 

Para nossa primeira live, a escola não tinha um canal no YouTube. Tinha, mas não era ativo. A nossa primeira live foi no canal de um dos professores que já tinha um canal e mais desenvoltura. Então, a gente fez um cronograma também de lives com os alunos e ele vinha ajudar, porque, no início, para conectar, o Google Meet não aceitava mais de 100 pessoas e a gente teve reuniões com 400 pessoas. Abria várias salas ao mesmo tempo, uma transmissão simultânea, era uma loucura. Muitos professores vinham, a gente fazia um cronograma, eles vinham para ajudar. (GEAP, comunicação pessoal, 20 de outubro de 2022)

 

Quando observados os percentuais na Tabela 71, percebe-se que, na perspectiva dos gestores, todos os aspectos apresentados funcionaram de forma razoável, tendo recebido percentuais altos, destacando-se a “interação com os alunos” (93,4%), “adaptação e organização das aulas no ERE” (85,4%) e a “comunicação com os alunos” (84,0%).

No que se refere à comunicação e interação da escola com os alunos, também foram aspectos citados por alguns gestores como pontos positivos no uso das TD no ERE: “O uso de tecnologias possibilitou manter o contato escola-alunos e famílias dos alunos durante a pandemia” (G80, comunicação pessoal, 6 de novembro de 2022). Um exemplo de como as TD facilitaram a comunicação e interação com os alunos é mencionado por GEA (Comunicação pessoal, 5 de novembro de 2022):

 

E eu lembro bem, você tem reuniões, por exemplo, com os alunos. Eu trabalho com uma turma de líderes de turma e, quando eu tenho uma atividade, eu já faço a pauta no WhatsApp, já envio para o grupo deles. Eles já montam as sugestões e me enviam. Então, é muito interessante, muito bom.

 

Relativamente à adaptação e organização das aulas remotas, os gestores também falaram sobre os benefícios das TD para o ensino e a aprendizagem, principalmente metodológicos: “As estratégias diversificadas, considero algo positivo. Um jogo, por exemplo, que você põe lá e facilita a aprendizagem do aluno” (GEM, comunicação pessoal, 13 de outubro de 2022); “Esses recursos tornam o ensino dinâmico, atrativo, pois possibilitam usar metodologias diversificadas” (G53, comunicação pessoal, 22 de outubro de 2022; “Velocidade no envio e registro em rede” (G40, comunicação pessoal, 15 de outubro de 2022).

Destacaram, igualmente, o papel dos recursos digitais na organização das aulas remotas. GEAP (Comunicação pessoal, 20 de outubro de 2022) relatou um exemplo de mudança ocorrida:

 

Às vezes, acontecia, por exemplo, de o professor não vir, precisar faltar. Mas, a gente pedia que ele postasse uma atividade no SigEduc: “Poste uma videoaula. Poste algum material didático. Antes, isso não ocorria. E ajuda, porque antes ele não se preocupava. Hoje em dia, a gente pede e ele já se preocupa em deixar alguma coisa. E, às vezes, até o aluno pergunta: “Ah, Fulano não vai vir hoje. Ele vai mandar uma atividade?”

           

Um ponto que chamou a atenção na análise dos gestores, em relação aos aspectos das práticas remotas apresentados na questão ora em foco, foi o acesso aos recursos digitais.

Os dados analisados confirmam que, na percepção dos inquiridos, o “acesso dos professores a recursos tecnológicos (computador, internet, etc.)” funcionou melhor do que o “acesso dos alunos aos recursos tecnológicos (computador, internet etc.)”. Isso fica evidente quando são somados os percentuais dos gestores que apontaram ter funcionado bem ou de forma razoável o acesso dos professores às TD, cujo total alcança 100%.

Entretanto, o que surpreende é o alto percentual de gestores (90,7%) que indicou ter funcionado bem ou de forma razoável o acesso dos alunos às TD, haja vista a exclusão digital de grande parte dos estudantes, identificada nos dados recolhidos junto a esse segmento.

Como já mencionado, a explicação pode estar no fato de que o ERE durou por quase 2 anos (ou até um pouco mais do que isso, em algumas escolas do RN) e a situação dos estudantes pode ter evoluído, o que faz emergir memórias e percepções de momentos diferenciados desse período.

Além de apontarem o que funcionou ou não funcionou nas práticas remotas, os gestores também revelaram, em questão de múltipla escolha, composta por 15 itens, sua opinião acerca do que poderia ser melhorado nas aulas remotas emergenciais futuras.

A Figura 43 mostra a perspectiva dos gestores em relação a cada item da questão.

Figura 43

Aspectos a Serem Melhorados em Aulas Remotas Emergenciais na Percepção dos Gestores

Os aspectos mais apontados pelos gestores como os que necessitam ser melhorados em futuros contextos de aulas remotas emergenciais foram aqueles relacionados à formação sobre o uso pedagógico das tecnologias para professores (85,3%) e estudantes (80%) e formação sobre estratégias de ensino para aulas remotas direcionada aos professores (80%).

Em conversa com GEA (Comunicação pessoal, 5 de novembro de 2022), fica clara a necessidade de formação para os professores, em sua opinião, em razão de muitos deles serem “imigrantes digitais” (Prensky, 2001), ou seja, não serem nativos das linguagens digitais:

 

Agora, o que eu ainda percebo é que requer mais formação, porque nós temos muitos professores que nasceram em uma geração que não era da tecnologia e que precisam dessa formação. Muitos não tiveram como retroceder, ao contrário, eles tiveram que melhorar e têm que continuar melhorando. Eu vejo, por exemplo, professor fazendo live usando o Instagram; hoje, o professor usa muito o Instagram para isso.

 

Porém, a “falta de formação para o uso dos recursos” (G63, comunicação pessoal, 27 de outubro de 2022), aspecto considerado negativo no uso das TD durante a pandemia pelos gestores, reforça a necessidade de formação para desenvolver ainda mais as competências digitais não apenas dos professores, mas também dos alunos, para o presente e eventuais futuras aulas remotas.

A questão do acesso da escola a infraestruturas e ferramentas informáticas adequadas (76%) e do aluno, o acesso à internet (74,7%) e a dispositivos apropriados (65,3%) foram os aspectos subsequentes em termos de percentual que precisam de melhoria. Nesse sentido, G62 (Comunicação pessoal, 27 de outubro de 2022), ao enumerar os pontos negativos no uso dos artefatos digitais durante a pandemia, destacou a “dificuldade de acesso das escolas, professores e alunos às tecnologias da informação devido à falta de recursos financeiros”.

Já G24 (Comunicação pessoal, 9 de setembro de 2022) mencionou um ponto ainda carente de um sério debate e atenção no Brasil: a “falta de políticas públicas de auxílio digital tanto para professores quanto para alunos”. O problema encontra-se, mais do que na falta de políticas públicas, no modo como estas são implementadas: de forma fragmentada e instrumentalizante (Almeida, 2020; Pretto et al., 2021), sem a preocupação com o aspeto crítico, autoral e criativo do seu uso.

A dificuldade de acesso às TD, a falta de preparo e de formação foram bastante ressaltadas nos discursos dos gestores, professores e dos alunos nas entrevistas e nas respostas às questões descritivas dessa investigação. O depoimento de um dos gestores minudencia os desafios enfrentados pelos estudantes em decorrência da exclusão digital durante o ensino remoto:

A principal dificuldade para os alunos era a falta de acesso aos dispositivos, ou a um bom dispositivo, potente, com a memória boa. Quando o professor colocava qualquer atividade em que teria que baixar um vídeo, uma música, os alunos já reclamavam porque os celulares deles não aguentavam. Outra dificuldade: ter que dividir com os pais, porque muitos pais trabalhavam. Ter que dividir com os irmãos, porque a maior parte dos alunos tinham 2, 3 irmãos que estudavam em salas diferentes, mas tinham que usar o mesmo celular. Outra dificuldade: alguns não tinham acesso à internet, porque moravam em comunidades rurais. Então, era um desafio também para o professor, porque ele tinha que montar atividade impressa para os que não estavam assistindo aula. (GEA, comunicação pessoal, 5 de novembro de 2022)

 

Logo, constata-se que na visão dos gestores os aspectos que mais deixaram a desejar e que, portanto, precisam ser melhorados, referem-se à falta de acesso e preparo das escolas, dos professores e alunos com relação ao uso das TD, evidenciando a urgência de projetos de inclusão digital que, além de ofertar dispositivos e internet, preparem a escola para acessar o mundo, colocando-a na rede, por meio de um uso qualificado, reflexivo, crítico, autoral e criativo dos artefatos digitais (Bonilla & Oliveira, 2011; Bonilla & Pretto, 2011).

Com relação às práticas avaliativas adotadas pelos professores durante o ERE, G69 (Comunicação pessoal, 28 de outubro de 2022) apontou, em questão descritiva sobre os pontos positivos do uso das TD no ensino remoto, a “quebra da dinâmica do processo avaliativo tradicional”.

A Figura 44 mostra a percepção dos gestores quanto a 13 itens sobre as formas de avaliar utilizadas no ERE apresentados em questão de múltipla escolha.

 

Figura 44

Percepção dos Gestores sobre as Formas de Avaliação da Aprendizagem Utilizadas pelos Professores no ERE

Da leitura da Figura 44, fica patente que, na perceção de 88% dos gestores, a aplicação de “exercícios e atividades enviadas via e-mail ou redes sociais” foi a estratégia mais utilizada pelos professores para avaliar o desempenho dos alunos no seu processo de aprendizagem. Vale salientar que esta foi igualmente a forma de avaliar com maior percentual nas visões dos professores (81%) e dos estudantes (75,4%), já referidas.

Em conversa, GEAP (Comunicação pessoal, 20 de outubro de 2022), descreve como se dava esse processo de envio e devolução das atividades e destaca que a avaliação era tanto formativa como somativa (Torres & Marriott, 2016): 

 

Eu lembro que eles pediam para o aluno postar. Por exemplo, o professor passava uma atividade com as perguntas. Aí, o aluno respondia no Word e devolvia. Era mais assim. A gente trabalha com avaliação contínua e somativa. O professor deu a aula, fez as questões, o aluno respondia pelo Word. Respondia, tirava uma foto e anexava. Mas, aí, a gente pedia que não mandasse pelo WhatsApp. Até porque havia professor que tinha 24 turmas com 30 alunos cada uma. Se cada aluno fosse mandar, mesmo se apenas 500 estivessem participando, se 500 alunos fossem mandar a imagem pelo WhatsApp, não dava. Então, a gente pedia que eles anexassem no sistema SigEduc. Era mais fácil para o professor. Aí, muitos faziam questionários com o Google Forms, porque, no final, ele já saía com a nota.

 

A devolução de atividades por meio de e-mails e redes sociais, prática incorporada no ERE, causou o acúmulo de atividades, um problema para os professores, segundo GEA (Comunicação pessoal, 5 de novembro de 2022): “Uma prática que foi incorporada foi o professor passar atividade, pedir para o aluno responder, digitalizar a página e mandar a foto da atividade. Tinha professor que não aguentava mais os cadernos com tantas fotos dos alunos”.

Modos de avaliar relacionados ao comprometimento e responsabilidade do estudante, como “participação nas aulas síncronas” (69,3%) e “realização e entrega das atividades no prazo” (68%) também foram assinalados por um expressivo percentual de gestores.

Mudança nos critérios e práticas de avaliação durante o ERE na rede de ensino do RN são observadas nos discursos dos três segmentos investigados (gestor, professor e estudante). Dentre esses, estão os critérios relativos à aprovação e reprovação dos estudantes e aqueles relacionados aos prazos das atividades, que foram ampliados. As razões para tais mudanças são explicadas no depoimento de GEAP (Comunicação pessoal, 20 de outubro de 2022):

 

O ano de 2020 foi cíclico na rede estadual. Foi em ciclo: 2020 e 2021. Então, o aluno de 2020 que estava na 3ª série, ele estava automaticamente aprovado. E o aluno da 2ª série, de 2020 e 2021, ele só foi aprovado no final de 2021. Porque ele avançou automaticamente e tinha um plano de reinserção. Com relação aos prazos. O professor passava uma atividade e o aluno tinha.... Quando o professor está na sala, com o aluno ali com ele, pode exigir para aquele dia, mas uma atividade a distância, na plataforma, ela tinha que ter um prazo maior. A gente pedia ao professor um prazo mínimo para o aluno de 7 dias, para ele poder acessar, porque às vezes o aluno dizia: “Ah, eu vou usar o computador na casa de Fulano”.

 

Observa-se que, na visão de grande parte dos gestores escolares, os professores também estimularam a autonomia e o protagonismo dos estudantes nas formas de avaliar, quando os fizeram produzir textos (68%), slides (58,7%) e participar/realizar de seminários virtuais (58,7%) e, em menor proporção, elaborar mapas mentais, criar desenhos, memes, paródias, Histórias em Quadrinhos/Banda desenhada, além de avaliá-los por meio de quizzes e jogos digitais (Figura 44). Essas práticas avaliativas com o uso das TD, mais focadas na autoria dos estudantes, foram corroboradas nas entrevistas com os gestores:
 

Os professores faziam seminário pelo Meet. Botavam os alunos para pesquisar e apresentar os seminários. Eles botavam lá no WhatsApp o recadinho, lembrando que tal dia haveria apresentação de tais grupos. Eles faziam vídeos e botavam os alunos para fazerem vídeos. Os alunos faziam e postavam os vídeos. No ensino remoto, o professor teve que se adequar à nova realidade. Houve mudança, pois teve que se adequar, teve que usar. (GEM, comunicação pessoal, 13 de outubro de 2022)

 

A maioria dessas formas de avaliar o desempenho dos estudantes é interativa (Silva, 2016; Oliveira & Amante, 2016), ativa e lúdica, despertando seu interesse, sem deixar de destacar o rápido feedback que alguns desses modos de avaliar possibilitam (exemplo: jogos e quizzes) bem como o uso de diferentes mídias em sua realização (Dorotea & Pedro, 2015), como é o caso da criação de slides, banda desenhada e memes, facilitando a compreensão do que é perguntado.

O importante papel desempenhado pelas tecnologias digitais na gestão escolar e nas práticas de ensino e aprendizagem durante a pandemia, especialmente no ERE, foi reconhecido por quase a totalidade dos gestores escolares (98,7%), conforme se verifica na Figura 45, evidenciando o olhar positivo que os inquiridos possuem atualmente sobre o uso dos recursos digitais na educação.

 

Figura 45

Contribuição das TD na Gestão e nas Práticas de Ensino e Aprendizagem durante o ERE na Percepção dos Gestores

Várias são as razões apresentadas pelos gestores em suas comunicações que justificam essa contribuição. Elas vão desde a inovação e diversificação das práticas pedagógicas para além da sala de aula convencional até a interação entre professor e estudante e entre este e o conteúdo:

 

As práticas pedagógicas encontravam-se enraizadas em um “fazer pedagógico” atrelado à sala de aula. A pandemia nos mostrou que a tecnologia deve ser aliada ao processo de ensino e aprendizagem e que a interação dos alunos pode ser muito mais positiva. (G8, comunicação pessoal, 7 de julho de 2022)

 

Contribuem de forma muito significativa, porque eu vejo assim, além do conteúdo que os alunos aprendiam, eles tiveram que desenvolver muitas habilidades. E facilitou muito o trabalho do professor. Hoje em dia, o professor não se limita mais só a trabalhar na sala de aula, com quadro e giz, ou com o pincel, mas ele está trabalhando com esses aplicativos. Outra coisa, o professor já faz live. A aula ficou mais interativa, ficou melhor, entendeu? Eu lembro que a gente tinha um certo receio do aluno na sala de aula com o celular. Reclamava muito porque o aluno usava o celular na sala de aula e, às vezes, deixava de prestar atenção à aula. Mas, após a pandemia, nós passamos a ver o celular como uma ferramenta a nosso favor, para facilitar o trabalho na sala de aula. Eu digo muito que o lado negativo da pandemia foram as mortes, as sequelas da Covid-19, mas o lado positivo foi que nós saímos de um mundo limitado à sala de aula para um mundo virtual. (GEA, comunicação pessoal, 5 de novembro de 2022)

Apesar dos desafios enfrentados durantes o ERE, não se pode negar o papel central que os recursos digitais, especialmente a internet, exerceram no período, permitindo a continuidade das atividades educacionais, com a migração da modalidade presencial para a online, e das interações sociais entre os membros da comunidade escolar (gestores, professores, alunos e pais), agora mediadas por estes artefatos. A resiliência de todos estes atores atenuou os desafios da jornada e possibilitou a superação de um momento particularmente adverso.