7.2 Questão de Investigação II – Práticas adotadas com Tecnologias Digitais no ERE
7.2 Questão de Investigação II – Práticas adotadas com Tecnologias Digitais no ERE
Relativamente aos três grupos investigados, os resultados mostram que utilizar recursos digitais nas atividades escolares não era uma prática muito frequente antes da pandemia da Covid-19, tendo avançado exponencialmente durante a pandemia e, em menor nível, após a pandemia, em relação ao período pré-pandêmico, algo expetável tendo em vista o retorno às aulas presenciais. Este avanço na utilização de TD e sua manutenção no pós-pandemia também indica mudança e inovação nas práticas dos respondentes (Messina, 2001).
Inversamente, o estudo desenvolvido pelo Projeto Scientix (Bilgin et al., 2022) comprovou que o uso de tecnologias educacionais já se constituía rotina na prática dos professores na maioria dos países europeus participantes antes da pandemia.
Para além do avanço na utilização de tecnologias, as práticas de ensino e aprendizagem nas escolas estaduais de ensino médio do RN apresentaram outras mudanças durante o ERE, na perceção dos estudantes, professores e gestores, como a inserção de novas estratégias metodológicas para poderem se adaptar ao contexto do ensino remoto.
Uma delas foi a adoção da modalidade de ensino remota, com diferentes abordagens, tanto em formato síncrono, com atividades em tempo real, e assíncrono, com atividades online compartilhadas em plataformas digitais (Classroom, SigEduc, Facebook, Moodle, Instagram, etc.) ou enviadas pelo WhatsApp ou e-mail, como no formato misto, mesclando as duas abordagens.
Quanto às estratégias pedagógicas adotadas agregadas durante o ERE, o envio e recebimento de exercícios e atividades (e conteúdos) via e-mail ou redes sociais ficou no topo da lista, tendo sido ainda a estratégia avaliativa mais utilizada, indicada pelos estudantes (75,4%), professores (81%) e gestores (88%).
A participação em atividades síncronas, durante a pandemia, foi de igual modo uma estratégia bastante utilizada, também para avaliar os estudantes, e que funcionou, razoavelmente ou mesmo bem, na perspetiva de 64,5% dos estudantes, 80,6% dos professores e 86,7% dos gestores escolares.
Para simplificar as aulas remotas e facilitar a aprendizagem dos alunos em momento tão inusitado, os professores costumavam colocar, com frequência, questões para verificar se os alunos estavam compreendendo (92,8%), dividir as aulas em sequências mais curtas para engajar os alunos (90,3%) e, em menor percentual, desenvolver modelos de aulas invertidas (53,2%), uma estratégia pedagógica mais inovadora.
Por sua vez, assistir a vídeos sobre os conteúdos foi uma estratégia utilizada por mais da metade dos estudantes (53,9%), para realizar suas atividades remotas e sanar dúvidas.
A produção de conteúdos e materiais digitais (slides, textos, vídeos, infográficos, HQ/banda desenhada, podcasts, memes, paródias, mapas mentais), a realização/participação em quizzes e jogos digitais e a realização e/ou participação em seminários virtuais também foram práticas agregadas durante o ERE, condizentes com um uso mais interativo das TD (Silva, 2016), principalmente quando os estudantes eram os autores/criadores. Porém, estas estratégias foram indicadas por um número reduzido de respondentes, tendo o grupo dos estudantes apresentado uma perceção sobre o uso destes recursos inferior à dos professores e gestores.
Contrariamente, a realização de provas e testes, considerada uma prática avaliativa classificatória e convencional, em que o protagonismo centra na instrução e no professor (Galizia et al., 2022), foi mencionada por 38,5% dos estudantes, 53,6% dos professores e 40% dos gestores.
Constata-se, portanto, que predominaram práticas pedagógicas mais focadas na instrução e no professor (Lucas & Moita, 2020; Santos et al., 2021), inclusive práticas avaliativas sumativas (Torres & Marriott, 2016), sendo baixo o percentual de respondentes que afirmaram ter utilizado estratégias interativas e inovadoras, focadas no protagonismo dos alunos. Este resultado é consistente com o estudo do Projeto Scientix (Bilgin et al., 2022) e outros desenvolvidos no Brasil (Galizia et al., 2022; Lucas & Moita, 2020; Santos et al., 2021).
Em relação ao que funcionou, ou não, nas práticas escolares remotas, os três segmentos apresentaram perspetivas diferentes em relação aos aspetos que não funcionaram ou que funcionaram bem.
Quanto aos estudantes, o aspeto que melhor funcionou entre os apresentados foi o acesso a recursos tecnológicos (35,3%), e o que menos funcionou foi a motivação para os estudos remotos (57,7%). As principais razões apontadas pelos respondentes para a desmotivação dos estudantes foram: ausência de um ambiente doméstico adequado, conciliação dos estudos com outras atividades domésticas, falta de acesso aos recursos digitais e consequente compartilhamento de dispositivos e internet, falta de contato presencial com colegas e professores e isolamento social.
No que toca ao funcionamento do acesso dos alunos aos recursos digitais, na comparação entre os três grupos, os estudantes apresentaram uma perceção mais otimista (M=1,20) relativamente à apresentada pelos professores (M=,86) e gestores (M=,99) sobre o acesso dos estudantes. Isto pode estar relacionado com mudanças positivas no acesso dos estudantes aos recursos ao longo do recorte temporal que constituiu o ensino remoto (2020-2021), considerando o alto percentual (75,4%) que indicou não ter acesso ou ter acesso limitado aos recursos digitais durante a pandemia.
O estudo Painel TIC Covid-19 - 3ª edição (CETIC.BR, 2020), que abrangeu todas as regiões do Brasil, apresentou resultados convergentes com os desta investigação, já que referiu a falta de motivação para estudar e a falta/baixa qualidade da conexão à internet como dois dos principais óbices vivenciados no ensino remoto.
Na opinião dos professores, entre todos os itens, o que melhor funcionou foi a colaboração com seus pares, para trocar experiências, compartilhar estratégias, aplicativos e tutoriais (45,1%), mas o que menos funcionou foi a interação com e participação dos responsáveis pelos alunos/encarregados de educação (46,4%).
Condizente com este resultado, no estudo de Bilgin et al. (2022), 73% dos professores afirmaram que, durante o ensino remoto, a colaboração com outros professores para propiciar aos estudantes uma experiência de aprendizagem mais coerente aumentou, e apenas um percentual bem baixo deles (14%) considerou que o relacionamento com os pais funcionou bem.
Outros estudos realizados no Brasil ou internacionalmente (Dias-Trindade et al., 2020; Godoi et al., 2021; Lucas & Moita, 2020; Oliveira & Amancio, 2021; Scully et al., 2021; Souza & Vasconcelos, 2021) também apontaram a ampliação da colaboração entre os professores, em geral, por meio dos grupos de discussão nas redes sociais, nomeadamente Instagram, Facebook e WhatsApp.
Na visão de 65,3% dos gestores, a interação entre os professores e gestão da escola, expressa na colaboração para facilitar a troca de informações e a aprendizagem, foi o aspeto que melhor funcionou no ensino remoto, enquanto o maior percentual obtido quanto ao que menos funcionou (20%) indicou a autonomia, motivação, determinação e organização dos alunos.
Na investigação desenvolvida pelo Projeto Scientix (Bilgin et al., 2022), de modo similar, o item autonomia, motivação, determinação e organização dos aprendentes funcionou bem para 26% dos participantes daquele estudo. Contrariamente, para apenas 8% deles, a interação entre os professores e gestão da escola funcionou bem.